RODA VIVA


“Somos o que pensamos. Tudo o que somos, surge com nossos pensamentos. Com nossos pensamentos, fazemos o mundo” Buddha.

A terapia cognitivo comportamental (TCC) é um tipo de terapia que ajuda a mudar estados emocionais, por modificar algumas formas de pensamento, crenças limitantes e outras distorções cognitivas.

Basicamente, pressupõe que é a nossa interpretação dos eventos, em vez dos próprios eventos, o que causa as consequências indesejadas e/ou os estados emocionais negativos que experienciamos em determinadaa situações.

O foco da TCC está nos seguintes elementos da experiência subjetiva:

A= Ativação (tudo que dispara uma emoção)
C= Crença sobre o evento
C1 = Consequência emocional (estado emocional resultante)
C2 = Consequência Comportamental (nossas ações ou reações)

(Em inglês, é o ABC, onde A = activating event - evento que ativa o processo; B = beliefs - crenças; C = consequences - consequências; C1 = consequence emotional - consequência emocional; C2 = consequence behavioral - consequência comportamental).

Como se vê, nossas crenças determinam os “filminhos” que assistimos em nossa própria cabeça, ou seja, é o significado que damos a um evento que causa nosso estado emocional.

Esse estado emocional, por sua vez, impacta as ações que escolhemos ou as reações que nos escolhem.

Nossas ações são escolhas proativas que fazemos a respeito do que fazer frente a um evento, após considerar todas as opções disponíveis.

Nossas reações são respostas reativas que atuamos automaticamente quando acionadas.

Dou um exemplo:

Ação é quando tenho que tomar banho e tenho que considerar a hora do dia - de manhã, antes de sair - chuveirada rápida para retirar resto do sono do cérebro, tenho hora pra chegar ao trabalho, não dá pra ficar curtindo numa banheira com sais.

Reação é quando, de manhã, e por acreditar que meu cérebro continua dormindo quando saio da cama, sigo a seguinte rotina básica: fazer café, lavar o rosto, escovar os dentes, tomar primeiro xicrão de café, após o que, acredito que meus neurônios começam a fazer algumas conexões.

Espero que tenha ficado claro como minha crença matutina determina meu comportamento, quando estou “funcionando em piloto automático”, sem tomar qualquer decisão.

Respostas reativas são baseadas em limitações ou crenças irracionais, também conhecidas como distorções cognitivas.

(lembre-se do exemplo acima: uma neurologista que acredita que seu cérebro continua a dormir quando ela sai da cama – dificilmente acharia outra crença tão irracional).

Esses "botões" reativos estão em nosso inconsciente, como programas que são executados automaticamente, como uma rede tipo internet, da qual fazem parte todos os pensamentos, crenças, sentimentos, memórias, coisas que dizemos a nós mesmos, e até mesmo nossa fisiologia.

Este é um dos pontos onde a TCC se intersecta com a psicanálise, se lembrarmos como o próprio Freud descreveu a mesma: “A psicanálise não foi idealizada para impossibilitar reações patológicas, mas para dar liberdade ao ego do paciente para que possa decidir de uma forma ou de outra”. Bravo velho Sig!

Fica claro que: reação = patologia, enquanto decisão, escolha = liberdade, saúde.

Ao contrário da psicanálise, a TCC não se preocupa nem um pouquinho com o porquê de nossas crenças, ou de onde elas vêm.

O que faz é identificar, discutir e refutar crenças para que possam ser substituídas por outras, mais precisas e racionais.

Quero aqui fazer um parêntese para a diferença entre lógica e racionalidade.

Lógica, cada um tem a sua, e até esquizofrênicos tem sua própria lógica, que é chamada paralógica esquizofrênica.

Há muitos anos, novinha na área e, como todos os jovens, carregando a certeza de saber de tudo, trabalhava num enorme hospital psiquiátrico, onde um dos pacientes decidiu que eu era Nossa Senhora Aparecida e me seguia prá todo canto.

Até aí, problema nenhum. O problema começou quando ele começou a ter seguidores, e aí complicou. Munida de meu saber, fui confrontá-lo, e aqui vai a conversação que se seguiu:

Eu: Então você acha que sou NS Aparecida?
Ele: Sim senhora
Eu: NS Aparecida é preta?
Ele: É sim senhora.
Eu: Eu sou preta?
Ele: Não senhora.
Eu: Se NS é preta e eu não sou, como posso ser ela?
Ele: Porque a senhora está disfarçada, só pra que eu a reconheça.

10 a zero pro paciente. Lógica irrefutável. Acabei fazendo um trato com ele de que, já que estava disfarçada, não podia ter gente me seguindo, só ele. Funcionou bem.

E isso é racionalidade: decidir o que é melhor fazer, num determinado momento, baseado nas evidências.

A lógica me colocou contra a parede, a racionalidade salvou o dia.

Minha lógica baseou-se em crenças: “Sei tudo da área, pois acabei de receber meu título de especialista”.

Evidência: Titulo de especialista

Falha na lógica: Titulo de especialista não lhe confere infinito saber. Nada o faz.

A falha na lógica chama-se Pensamento Automático Negativo, que Freud chamou de Neurose de Repetição.

O Dr. Daniel Amen, em seu livro “Mude seu cérebro, mude sua vida” (Change your brain, change your life), chama esse tipo de pensamento de ANTs (formigas, em inglês), e faz uma analogia interessante, isto é, que quando pensamos dessa forma, é como se pequenas formigas se espalhassem cérebro afora... é só lembrar o que acontece quando pegamos numa latinha cheia de formigas: elas tendem a rastejar fora da latinha, pra cima de nossa mão, braços, e vão tão longe quanto permitirmos, antes de jogar a latinha longe e nos sacudirmos freneticamente.

É por isso que esse doutor sugere que evitemos pessoas negativas porque “as formiguinhas deles podem se juntar com as nossas, se acasalarem e se reproduzirem...”.

Há vários métodos para avaliar a qualidade de nossas crenças, para determinar se nos são úteis, e falo de utilidade em seu sentido mais ético, isto é, se fazem nossa vida, a vida de nossos semelhante e a sociedade onde vivemos, algo melhor para todos.

Não me refiro à utilidade egocêntrica do que é melhor pra mim, nesse momento, que se dane o mundo. Isso se chama reinado do ID, se for psicanalista, dependência, caso for psiquiatra, ou pecado, segundo me explicou meu avô quando eu, criança, e tendo sido colocada em colégio de freiras, fiquei confusa com que diabos vinha a ser “pecado”.

Em tendo buscado minha enciclopédia pessoal, no caso meu anárquico e ateu, graças a Deus, avô, disse-me: “Pecado é tudo o que você fizer contra você mesma, contra seus semelhantes, ou contra o mundo onde você vive”.

Aqui vão algumas perguntas que podemos nos fazer para identificar uma crença irracional ou limitante:

1- Como é que sei que isso é verdadeiro?
2- Quais são os benefícios presentes e futuros que essa crença me dá?
3- Quais são as consequências negativas, presentes e futuras, que essa crença
traz?
4- O que é que essa crença diz a meu respeito, a respeito dos outros e do mundo?

Se nossas crenças não passarem pelo teste acima, podemos ter a certeza de que não nos servem mais.

Podem ter servido a algum propósito extremamente importante no passado, mas agora precisam ser atualizadas.

A psicanálise chama a isso “Mecanismos de Defesa”, ou seja, algo no qual nos baseamos, num passado distante, para sobrevivência, mas que agora não funciona mais, é carregar peso morto.

Por exemplo: o exército romano foi imbatível, na época de Julio César, devido à sua formação, as armas inventadas e os escudos. Me diga, como se sairiam numa guerra hoje, frente a um propulsor de granadas?

Assim é com nossas crenças.

Se, quando tinha 3 anos de idade, chorar era uma boa ideia para conseguir que alguém me botasse no colo e me afagasse, certamente não vai funcionar direito nesta minha provecta idade, por vários motivos,sendo um dos principais que, a qualidade dos afagos que preciso, mudou.

E se vocês não acreditam nas consequências nefastas de crenças irracionais, deem uma olhadinha no mundo.

O mundo islâmico está pegando fogo porque uma criatura fez um filme insultando o profeta Maomé, e seus seguidores se sentem no direito de matar e destruir porque, como apareceu nos cartazes que carregavam, “Nossa fé é tudo o que temos”.

Israel está se sacudindo nas tamancas, porque os USA não estão tomando qualquer atitude militar contra o Irã, que diz que está fazendo sua bombinha atômica básica, e por algum motivo superior, os USA deveriam, em qualquer situação, defender os interesses do já citado Israel, o qual, já tem a já citada bomba.

A tal da “guerra contra as drogas” tem sido um desastre econômico, social e moral, mas continua firme e forte, porque é um excelente negócio para a indústria da cadeia, aqui nos EUA.

A busca desenfreada pelo “sucesso”, entendido em nossa sociedade como o ter dinheiro e poder, tem tido consequências globais insanas, tais como o desmatamento da Amazônia, o aquecimento global, e metade do mundo ocidental morrendo por excesso de comida, enquanto cerca de 500 mil crianças, todos os anos ficam cegas por não terem a comida suficiente para retirar a vitamina A necessária para a visão.

E nem vou entrar no campo da política, porque senão isso vira uma novela mexicana, que não é minha meta.

E, como comecei com Buddha, termino com Zeus, só porque gosto.

“Oh vergonha! como ousam os mortais colocar a culpa em nós deuses, pois dizem que os males vem de nós, quando, em vez disso, os causam por sua própria triste imprudência ..." (Odisséia:1,32-34 )

Continuaremos com escolhas e consequências no próximo post.

Comentários

  1. Muito bom esse post! Avaliar a qualidade de nossas crenças é fundamental para a sanidade de nossa vida. Muito legal também a forma como exemplifica cada assunto, e essa de hoje de N. S. Aparecida foi ótima! Pra finalizar, acho seu avô o máximo - conseguiu dar uma explicação simples e pertinente para pecado. Parabéns.

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