TRATAMENTOS DROGADEPENDÊNCIAS


Começo informando que a definição de drogadependência que vai abaixo não é necessariamente aquela com a qual concordo totalmente, mas como é a (quase) universalmente aceita, tenho que colocá-la.

Assim, a toxicodependência (drogadependência) é definida como uma doença complexa, caracterizada por intenso e, às vezes, incontrolável desejo pela(s) droga(s), junto com a busca compulsiva da mesma, e o pensamento, e consequente comportamento, persistem mesmo em face de conseqüências devastadoras.

Embora o caminho para a dependência começe com o ato voluntário do uso, ao longo do tempo, a capacidade da pessoa de optar por não fazê-lo torna-se comprometida, e o buscar e consumir a droga torna-se compulsivo.

Este comportamento resulta em parte pelos efeitos da exposição prolongada do fármaco no funcionamento do cérebro, e em parte pela estrutura psíquica de base do indivíduo.

A dependência afeta múltiplos circuitos cerebrais, incluindo os de recompensa e motivação, aprendizagem e memória, e aqueles de controle do comportamento.

Concordo com as alterações nos circuitos, obviamente, posto que podem ser demonstradas, e as consequências são a disrupção de inúmeros, senão todos, os aspectos de vida do dependente.

Por esta simples razão, seu tratamento não é simples.

Programas de tratamento eficazes normalmente incorporam muitos componentes, cada qual dirigido a um aspecto particular do problema e suas consequências.

O tratamento deve ajudar o indivíduo a parar ou controlar o uso, manter um estilo de vida onde possa ter escolhas e não dependência, e conseguir um funcionamento produtivo na família, no trabalho (estudo) e na sociedade onde está inserido.

As pessoas não podem simplesmente parar de usar drogas por alguns dias e achar que estão curados (embora este também seja comportamento padrão de dependentes).

A maioria dos pacientes requer tratamento a longo prazo e/ou múltiplos episódios de tratamento para atingirem o objetivo final de serem capazes de cuidar de sua própria vida.

PRINCÍPIOS DE UM TRATAMENTO EFICAZ


Pesquisa científica desde meados de 1970 mostra que o tratamento que pode ajudar os pacientes a parar de usar, evitar recaídas e recuperar o controle sobre suas vidas, isto é, tratamentos eficazes, implicam nos seguintes pontos:

* Não há nenhum tipo de tratamento que funcione bem com todos os tipos de dependentes

* O tratamento deve ser facilmente disponível.

* Um tratamento eficaz atende a múltiplas necessidades do indivíduo, e não apenas seu abuso de drogas.

* É fundamental que o indivíduo permaneça em tratamento por um período de tempo adequado.

* Terapias indivíduais e/ou em grupo (sendo as mais eficazes as comportamentais/cognitivas).

* Medicamentos são um elemento importante no tratamento para muitos pacientes, especialmente quando combinados com aconselhamento e outras terapias comportamentais.

* O plano de tratamento de um indivíduo, assim como sua evolução dentro do mesmo, devem ser continuamente avaliados e modificados conforme necessário para garantir que suas necessidades (as do paciente) sejam atendidas.

* Sempre lembrar que,a maioria dos drogadependentes tem outros distúrbios mentais, os quais provavelmente os levaram à dependência.

* Embora esteja na moda e na mídia (pelo menos aqui nos EUA), a desintoxicação por medicamentos é apenas o primeiro passo no tratamento, e não provoca, de per si, qualquer modificação a longo prazo. É apenas um passo, caríssimo para dizer a verdade, e, na maioria das vezes, desnecessário.

* O tratamento NÃO precisa ser voluntário para ser eficaz, apesar de toda a barulheira de gente que, quero crer, tem boas intenções, mas não tem qualquer conhecimento real do problema.

* O uso de drogas durante o tratamento deve ser monitorado continuamente, posto que recaídas ocorrem (e como ocorrem!)

* Os programas de tratamento devem avaliar os pacientes para a presença de HIV/AIDS, hepatite B e C, tuberculose e outras doenças infecciosas, bem como fornecer programas educativos para redução de riscos, e para ajudar os pacientes a modificar comportamentos que os colocam em risco de contrair ou espalhar doenças infecto contagiosas.

Isto posto, vamos à parte prática.

Embora pouco se fale sobre o assunto (e isso não sei por que) e muito mal se fale a respeito de medicamentos (o que entendo, já que, quando mal usados ou abusados, se constituem num sério problema), há várias medicações que vem sendo usadas há muitos anos para ajudar no tratamento das dependências, e são elas:

(Coloquei por tratamento de substância)

Tratamento Álcool

Acamprosate, Dissulfiran, Naltrexona e Topiramato.

O Acamprosate reduz os sintomas de abstinência prolongada, tais como insônia, ansiedade, agitação e disforia (estado emocional desagradável, como depressão, ansiedade e/ou irritabilidade). Costuma ser mais eficaz quanto mais grave for a dependência.

O Disulfiram interfere com a degradação do álcool, resultando na acumulação de acetaldeído, o qual, por sua vez, produz uma reação muito desagradável, que inclui náuseas e palpitações no caso de ingesta de álcool.

O Naltrexone bloqueia os receptores opióides no sistema de recompensa do cérebro, reduzindo em muito as recaídas.

Tratamento Opiáceos (tem gente que chama de Opióides)
Buprenorfina, Metadona e Naltrexone.

A Buprenorfina e a Metadona agem nos mesmos alvos da heroína e morfina no cérebro, suprimindo assim os sintomas de abstinência e aliviando os desejos compulsivos pela droga (cravings).

O Naltrexone funciona bloqueando os efeitos da heroína ou outros opiáceos nos receptores do cérebro, e por isso mesmo só deve ser usado em pacientes que já foram desintoxicados.

Esses medicamentos ajudam os pacientes a se desprenderem da busca da droga e consequente comportamento criminoso relacionado e se tornarem mais receptivos aos tratamentos comportamentais.


Tratamento Tabaco

Já existem inúmeras terapias de reposição de nicotina sem necessidade de receita médica, incluindo emplastros (patch),vaporizador (spray), goma de mascar, pastilhas e cigarros eletrônicos.

Caso nada disso funcionar, há a Bupropiona e a Vareniclina, que embora tendo mecanismos de ação diferentes, ambas ajudam na prevenção de recaídas.

TRATAMENTOS COMPORTAMENTAIS (Podem ser com ou sem internação)

Ajudam o paciente a se envolver no processo de tratamento, modificar suas atitudes e comportamentos relacionados ao abuso de drogas, e a aumentar e/ou desenvolver habilidades/competências de vida saudáveis (a UNICEF define habilidades de vida como as habilidades psicossociais para um comportamento adaptativo e positivo, que permitem aos indivíduos lidar eficazmente com as demandas e os desafios da vida cotidiana. São agrupados em três grandes categorias: habilidades cognitivas para analisar e utilizar informações, habilidades pessoais para desenvolvimento do gerenciamento da própria vida, e habilidades interpessoais para se comunicar e interagir eficazmente com os outros).

Dentre os inúmeros tipos de tratamento, vou dar meus dois preferidos, os quais conheço de dentro para fora, e tenho seguido nos últimos 25 anos, e são, de novo por ordem alfabética:
San Patrignano (Itália)e Stanton Peele e seu Life Process Tratment (Tratamento do Processo de Vida ,(USA)


Filosofia que rege o tratamento em San Patrignano:

“Nós não consideramos os dependentes como alguém doente e intratável, destinado a viver com a sua condição até a morte. Em vez disso, os vemos como alguém com um problema, indivíduos únicos, cheios de potencialidades e capacidades que precisam e devem se redescobrir e aprender a se expressar....”

“Aprender uma profissão é uma etapa fundamental na recuperação. Não se pode reconstruir a própria dignidade por pedidos ou pretensão, mas por arregaçar as mangas no trabalho para a sua reconstrução e defendendo-a com o seu próprio trabalho...”

“Ao longo dos anos, as oportunidades de formação profissional aumentaram consideravelmente, mudando e evoluindo com base nas necessidades da sociedade, o que nós sempre tivemos em máxima consideração. Os clientes, portanto, recebem o melhor dos treinamentos. Mais do que nunca, os clientes têm a possibilidade de escolher entre uma variedade de programas de formação, porque nós sentimos que é justo que todos sejam incentivados a perseguir seus próprios interesses e talentos apaixonadamente, cultivando-os com seriedade e compromisso.”

Naturalmente traduzi apenas algumas partes pois o discurso é longo para este blog, mas as partes que escolhi são as que me são caras, como profissional, como ser humano e como italiana rebelde por princípio e convicção. Falta apenas dizer que lá tomei um dos melhores vinhos de minha vida, vinho este produzido na comunidade, desde as uvas, e lá também consumido pelos própios produtores. E se isso não é o mais belo ensino do que é auto gerenciamento e aprendizado de vida, então juro que não sei o que é.

A discussão a respeito de Stanton Peele e suas idéias (as quais compartilho), fica para o próximo, senão isso vai ficar mais comprido que Guerra e Paz, o que absolutamente não é minha intenção.

Salute!

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