PENSAMENTO CRIATIVO
“Aquele que pensa pouco, erra muito” - Leonardo da Vinci.
No post anterior, vimos a definição mais aceita de criatividade, assim como os quatro elementos que a compõe. Hoje, vamos falar do pensamento criativo, juntando fome com vontade de comer.
R. J. Sternberg, num artigo revolucionário no Creativity Research Journal, revisou o conceito de pensamento criativo, incluindo itens como "investimento" e "propulsão”, e sugerindo que há oito tipos de contribuição criativa (ou pensamento criativo):
Replicação – confirma que determinado campo (problema, situação, pesquisa, arte) é correto.
Ex: Qualquer experimento científico que reproduza os mesmos resultados. Sabemos que a fórmula da água é H2O, porque, todas as vezes que se juntam duas moléculas de hidrogênio e uma de oxigênio, dá água, e, se colocarmos duas moléculas de oxigênio, vai dar a maravilha desinfetante que é a água oxigenada.
Redefinição - a tentativa de redefinir o campo ou como este é visto.
Um exemplo que adoro é a redefinição de desenho animado como feita pelo PIXAR.
Incrementação - um contributo criativo que move o campo para a frente, na direção que já está seguindo.
Essa é mole, só pensar no telefone celular.
Avanço - o que avança o campo além do ponto anterior.
Aqui os exemplos são infinitos, ciências médicas, engenharia, física, etc.
Redirecionamento - move o campo numa direção nova e diferente.
Temos o exemplo de Steven Spilberg e George Lucas, com “Guerra nas Estrelas”, que moveu o campo da cinematografia numa nova direção.
Redirecionamento a partir de um ponto no passado - move o campo de volta a um ponto anterior para avançar numa direção diferente.
O melhor exemplo que me vem à memória é o descobrimento do Haloperidol, pelo Dr. Janssen, que estava pesquisando medicação antihemética, e acabou inventando um potente antipsicótico.
Recomeço / reiniciação - o campo é deslocado para um ponto de partida diferente.
Esse é Von Braun na cabeça, o qual, após inventar as V2 que quase destruíram Londres na segunda guerra mundial, transferido que foi para a NASA, e partindo da mesma base, botou o homem na Lua.
Integração - combinação de duas ou mais formas diferentes de pensar sobre determinado campo, numa forma única.
O melhor exemplo é o Pensamento Integrativo, área da Neurociência Aplicada, inventada por Graham Douglas em 1986, no qual descreve o pensamento integrativo como o processo de integração da razão, intuição e imaginação da mente humana, visando o desenvolvimento de um continuum holístico de estratégias, táticas, ações, análises e avaliações para resolver um problema em qualquer campo, definindo problema como a diferença entre o que se tem e o que se quer.
Isso posto, vamos aos fatos com os quais vivemos.
A maior parte de nosso pensamento, em nossa cultura ocidental, incluindo nosso sistema educativo, enfatiza a análise: somos ensinados a compreender enunciados, seguir ou criar um argumento lógico, descobrir respostas, eliminar os caminhos errados e focar no que é considerado “correto”, em detrimento de outro tipo de pensamento, aquele que explora ideias, gera possibilidades, e procura por mais do que uma resposta “correta”. Continuamos sendo educados dentro do princípio de “ou...ou” ao invés de “isto e mais aquilo”, pois ambos os processos são vitais para nosso desenvolvimento.
Só para clarear bem o conceito, podemos definir os dois tipos de pensamentos da forma abaixo:
PENSAMENTO CRÍTICO PENSAMENTO CRIATIVO
Analítico ................................................. Gerador
Convergente ............................................... Divergente
Vertical ...................................................Lateral
Probabilidade ..............................................Possibilidade
Julgamento ................................................. Sem julgamento
Focado ......................................................Difuso
Objetivo.................................................... Subjetivo
Resposta ................................................... Mais perguntas
Cérebro Esquerdo ............................................Cérebro Direito
Verbal ......................................................Visual
Linear ......................................................Associativo
Raciocínio ..................................................Inovação
Sim, mas… ...................................................Sim, e?
Na vida do dia a dia, ambos os tipos de pensamento nos são extremamente importantes e necessários, pois, primeiro, temos que analisar o problema que se nos apresenta, gerar as possíveis soluções, escolher e implementar o que nos parece a melhor solução, e finalmente, avaliar a eficácia da solução escolhida. Dá pra notar que sambamos de um tipo de pensamento a outro, sendo analíticos e criativos, mesmo porque essa separação de função de cérebros direito e esquerdo é puramente elucidativa e não como o cérebro funciona na realidade, sendo ambos os hemisférios interdependentes.
Por exemplo: Acabo de receber uma estante modular, toda desmontadinha. Abro o manual de instruções (análise do problema: o que tenho - estante desmontada; o que quero - estante montada). Separo as partes e os parafusos e descubro que vou necessitar de uma chave de fenda. Não tenho chave de fenda em casa (pura estultice da autora), mas penso que uma faquinha de ponta arredondada, pode funcionar tão bem quanto (pensamento analógico e criativo, gerando possibilidades). Uso a faquinha como se fora uma chave de fenda para virar os parafusos (mistura de pensamento analítico, pois aprendi como se usa uma chave de fenda, e criativo, usando uma faca como se…). Funciona! (Oba! Sou um gênio). Baseada em minha genialidade previamente determinada por fatos (pensamento analítico), não presto muita atenção no parafuso seguinte, a faca escapa e corto o dedo (anta escalafobética, grito a mim mesma). Sangue se espalha. Que faço? (pensamento analítico: o que é mais importante nesse momento? Cuidar do dedo ou continuar a tarefa? Escolha: ou isso ou aquilo, mais pensamento analítico). Boto bandaid no dedo e limpo o sangue esparramado (tarefas específicas, pensamento analítico na escolha). Retorno à tarefa de apertar os parafusos, desta vez com redobrado cuidado (redirecionamento a partir de um ponto no passado – pensamento criativo). Termino de montar a estante: objetivo alcançado - problema resolvido.
Viu só? É simples e a gente faz isso o tempo todo, sem sequer pensar a respeito, pelo simples fato que fomos ensinados a pensar que criatividade é o campo de um Pablo Picasso, de um Beethoven e outros desse calibre. Fazemos isso em detrimento de nossa própria criatividade, pois fomos condicionados a nos comparar, a ter exemplos definidos do que é bonito, feio, gostoso, nojento, adequado, inadequado, e por aí vai. Nosso treino, desde a mais tenra idade, é a respeito do que pensar ou deixar de pensar, ao invés de como pensar. Fomos condicionado a crer que “pensar” é tarefa árdua, e não apenas mais uma função do cérebro, tal como espalhar o sangue pelo corpo é função do coração.
Por acaso se pensa, a cada “tum-tá” da bomba cardíaca, que o “tum” é o sangue chegando ao coração, e o “ta” é o mesmo saindo? Não, porque a coisa funciona por si mesma, como o pensamento criativo funciona naturalmente nas crianças até mais ou menos os quatro anos de idade, após o que, em geral, vai se perdendo essa capacidade em nome de um aprendizado, não se levando em consideração que o cérebro é extremamente espaçoso, como coração de mãe, onde sempre cabe mais um.
Filhos bastardos desse “treinamento comparativo”, são as mazelas que fazem tão mal ao mundo onde vivemos: fanatismo por qualquer coisa, de religião a política, de ciência a sonho; racismo de todas as formas e sua irmã gêmea, a culpabilização ou busca pelo bode expiatório; o dar mais importância a “se estar certo” do que a ser feliz; a busca pelos ideais inculcados de consumo (beleza, juventude, riqueza e sucesso) a qualquer custo.
Mas, a boa nova é que a criatividade perdida pode ser recuperada. Como? Conto no próximo post.
“Seu tempo é limitado, então não o desperdice vivendo a vida de outra pessoa. Não caia na armadilha do dogma - que é viver com os resultados do pensamento de outras pessoas. Não deixe que o barulho da opinião dos outros cale a sua própria voz interior. E o mais importante, tenha a coragem de seguir seu coração e sua intuição”. Steve Jobs
Sonhar mais um sonho impossível clique aqui
NA - Para este post, baseei-me nos trabalhos dos seguintes gênios (na minha opinião):
Michael Mumford - psicólogo americano e diretor do Centro de Pesquisa Social Aplicada, na Universidade de Oklahoma. Seu trabalho está centrado em criatividade, inovação, planejamento e liderança ética. Um dos artigos dele que mais gosto é “Creative Thinking: Processes, Strategies, and Knowledge” (Pensamento Criativo: Processos, Estratégias e Conhecimento), The Journal of Criative Behavior, Vol.46, Issue 1, pg 30-47, Março 2012.
Robert Jeffrey Sternberg (8 Dezembro 1949 – Newark, NJ), psicólogo americano, cujo currículo é tão enorme que não dá para colocar aqui. Entre suas grandes contribuições à psicologia, talvez a mais importante seja a Teoria Triárquica da Inteligência, embora tenha várias outras teorias influentes relacionadas com sabedoria, criatividade, estilos de pensamento, amor e ódio. E, maravilha das maravilhas, dá prá ler a obra dele como se fosse um livro do Critchon (aquele que escreveu o Jurassic Park).
Pequena bio dos citados neste post.
George Walton Lucas Jr.(14 Maio 1944- Modesto, California) é um produtor de cinema americano, roteirista, diretor e empresário, fundador, presidente e executivo-chefe da Lucasfilm. Seu primeiro filme, enquanto ainda estudante, THX-1138:4EB (não faço idéia de como traduzir isso), foi enorme fracasso. Chateado mas não a ponto de desistir, foi trabalhar em seu Segundo projeto, American Graffiti…e o resto é história. Em 1977, Star Wars ( Guerra nas Estrêlas), rendeu US$ 513 milhões no primeiro mês após lançamento.
Graham Douglas é um dos pioneiros no campo da Ciência Aplicada da Mente, criador do Aperfeiçoamento Integrativo . Não consegui achar em lugar algum quando e onde nasceu, mas pela foto dele, dá para notar que é novinho.
John Michael Crichton (23 Outubro 1942 – 4 Novembro 2008), médico, escritor, produtor, diretor de cinema. Considerava-se criativo demais para ser um bom médico.São dele Jurassic Park e uma das séries mais longas da TV, ER. Seu primeiro best seller “The Andromeda Strain” foi publicado enquanto ainda era estudante de medicina.
Steven Allan Spielberg (18 Dezembro 1946- Cincinati-Ohio) é um diretor de cinema americano, roteirista, produtor, designer de vídeo games e empresário. É considerado uma das pessoas mais influentes no cinema, e, entre seus filmes temos clássicos como Jaws (Tubarão-1975),Close Encounters of the Third Kind (Contatos Imediatos do terceiro Grau-1977), Raiders of the Lost Ark (Os Caçadores da Arca Perdida-1981) , ET (1982).
Paul Adriaan Jan, Baron Janssen (12 setembro 1926, Turnhout, Bélgica – 11 novembro 2003, Roma, Itália). Em 1953, descobriu sua primeira droga, a ambucetamida, um antiespasmódico, muito eficaz em dores menstruais, e, em 1958, o Haloperidol, que revolucionou o tratamento da Esquizofrenia. Não bastasse, desenvolveu outros analgésicos como o droperidol e etomitate, amplamente usados em anestesia e o difenoxilate, que todo mundo já usou, pois é o famoso Lomotil, para diarreia. No total, descobriu mais de 80 medicamentos, sendo que quatro deles estão na lista de Medicamentos Essenciais da Organização Mundial de Saúde.
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Wernher Magnus Maximilian, Freiherr von Braun (23 Março 1912 – 16 Junho 1977), alemão naturalizado americano, físico nuclear, engenheiro aereoespacial.Foi um dos principais líderes do programa de foguetes V-2 na Alemanha nazista. Em 1945, entregou-se aos americanos e passou a trabalhar para o Exército dos EUA, e depois para a NASA, sendo o primeiro diretor do Centro de Vôo Espacial Marshall. Entre outras coisas, arquitetou e desenvolveu os foguetes Saturno, usados para as missões Apollo, colocando o homem na lua.
Não vou colocar a bio do Steve Jobs, dado que, em tendo morrido ano passado, todo mundo já sabe, nem a de Leonardo da Vinci para que não pensem que sou tendenciosa em relação ao italiano gozador.
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