TRAUMA NA INFANCIA PODE DESTRUIR SUA SAÚDE DÉCADAS DEPOIS DE TER ACONTECIDO, E NÓS ESTAMOS IGNORANDO ISSO.
Este post é tradução direta de um TED talk, cujo link está no final. É uma coisa tão séria e tão absurda, que me pergunto como não se fala mais sobre isso, e quanto tempo levei antes de ter alguma informação a respeito. Mas, como não adianta chorar sobre leite derramado, o que posso fazer é espalhar a informação para quantos mais profissionais da área e leigos em geral, quanto puder. Ajudem e repassem. Temos que falar a respeito, berrar a respeito, fazer o que for possivel e mais um pouco, a respeito. Então, aqui vai:
“Em meados dos anos 90, o CDC (Center for Desease Control- Centro para Contrôle de Doenças) e Kaiser Permanente descobriram uma exposição a um único fator, aumentava drasticamente o risco de desenvolver 7 em cada 10 das principais causas de morte nos Estados Unidos. Em altas doses, ele afeta o desenvolvimento do cérebro, o sistema imunológico, o sistema hormonal, e até mesmo a maneira como nosso DNA é lido e transcrito. Pessoas que estão expostas a doses muito elevadas, têm o triplo de risco de vida de doenças cardíacas e câncer de pulmão e uma diferença de 20 anos na expectativa de vida. E, no entanto, os médicos não são treinados para realizar exames ou tratamentos de rotina. Agora, a exposição que estou falando não é um pesticida ou um produto químico numa embalagem. É o trauma de infância.
Ok. Que tipo de trauma estou falando? Não estou falando de falhar em um teste ou perder um jogo de basquete. Estou falando de ameaças que são tão graves ou generalizada que literalmente penetram na nossa pele e mudam nossa fisiologia: coisas como abuso ou negligência, ou crescer com um dos pais que luta com uma doença mental ou dependência de substâncias.
Por longo tempo, vi essas coisas da maneira que fui treinada para vê-las:ou como um problema social ou como um problema de saúde mental , e só tinha que fazer os encaminhamentos necessários. E então algo aconteceu para me fazer repensar toda minha abordagem. Quando terminei minha residência, queria ir para algum lugar onde me sentisse realmente necessária, algum lugar onde pudesse fazer a diferença. Então, vim trabalhar para o Centro Médico do Pacífico, na Califórnia , um dos melhores hospitais privados no norte da Califórnia, e juntos, abrimos uma clínica em Bayview-Hunters Point, um dos mais pobres e carentes bairros em San Francisco. Antes disso, havia apenas um pediatra em toda Bayview para servir mais de 10.000 crianças, e aí fomos capazes de prestar cuidados de qualidade superior, independentemente da capacidade de pagamento. Foi tão legal. Mudamos as disparidades típicas da saúde: o acesso aos cuidados, as taxas de imunização, as taxas de internação por asma, e superamos todas as expectativas. Nos sentimos muito orgulhosos de nós mesmos.
Mas aí comecei a notar uma tendência preocupante. Um monte de crianças estavam sendo encaminhadas para mim com TDAH ou Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, mas quando eu fazia uma história e exame físico completos,o que encontrava era que maioria dos pacientes não encaixava neste diagnóstico. A maioria das crianças que estava vendo, tinha experimentado trauma tão grave que parecia que alguma coisa diferente estava acontecendo. De alguma forma, eu estava perdendo algo importante.
Agora, antes de fazer residência, fiz um mestrado em saúde pública, onde me ensinaram que, se você é médico e vê 100 crianças bebendo do mesmo poço, e 98 delas desenvolvem diarréia, você pode ir em frente e escrever prescrições de antibióticos sem parar, ou pode dizer: "que diabos há neste poço?" Então comecei a ler tudo o que podia sobre como a exposição à adversidade afeta os cérebros e corpos de crianças em desenvolvimento.
E então um dia, meu colega entrou no escritório, e disse, "Dr. Burke, você viu isso?" Em sua mão, uma cópia de um estudo de pesquisa chamado Experiências Adversas da Infância. Esse dia mudou minha prática clínica e, finalmente, minha carreira.
O Estudo de Experiências Adversas na Infância é algo que todo mundo precisa conhecer. Foi feito pelos doutores Vince Felitti (Kaiser) e Bob Anda (CDC), no qual exploraram 17.500 adultos a respeito de sua história de exposição ao que eles chamaram de "experiências adversas na infância"(ACEs). As questões incluiram abuso físico, emocional e/ou sexual; negligência física ou emocional; doença (s) mental, dependência de substâncias, encarceramento, separação ou divórcio dos pais e violência doméstica. Para cada sim, há um ponto na escala ACE. Daí correlacionaram essas pontuações com os resultados de saúde. O que descobriram foi surpreendente: 1- ACEs são incrivelmente comuns. 67% da população tinha pelo menos um ACE, e 12,6% (1 em cada 8), tiveram quatro ou mais ACEs. 2- Havia uma relação dose-resposta entre ACEs e resultados de saúde: maior a pontuação ACE, pior os resultados de saúde. Para uma pessoa com uma pontuação ACE de quatro ou mais, o risco relativo de doença pulmonar obstrutiva crônica foi duas vezes e meia a mais do que alguém com uma pontuação ACE de zero. No caso da hepatite, também foi duas vezes e meia. Para a depressão, era quatro vezes e meia. Para suicídio, era 12 vezes. Uma pessoa com uma pontuação ACE de sete ou mais tinha o triplo de risco de vida de câncer de pulmão e três vezes e meia o risco de doença isquêmica do coração, o assassino número um nos Estados Unidos da América.
O pessoal começou a olhar esses dados e dizer: “Bem, é claro que isso vai arruinar a sua saúde. Isso não é ciência. Este é apenas mau comportamento”. Ou, "Vamos lá. Você teve uma infância difícil, claro que está mais propenso a beber e fumar e fazer todas essas coisas."
Acontece que é exatamente onde a ciência entra. Agora, entendemos melhor do que jamais pudemos antes, como a exposição à adversidade precoce afeta os cérebros e corpos de crianças em desenvolvimento. Ela afeta áreas como o núcleo accumbens, o centro de prazer e recompensa do cérebro que está envolvido na dependência de substâncias. Ela inibe o córtex pré-frontal, o qual é necessário para o controle de impulsos e para funções executivas como julgamento, e é tmbém uma área crítica para o aprendizado. E em exames de ressonância magnética, vemos diferenças mensuráveis na amígdala, centro de resposta de medo do cérebro. Portanto, há razões neurológicos reais do porque as pessoas expostas a altas doses de adversidade são mais propensas a se envolver em comportamentos de alto risco, e isso é importante saber.
Mas acontece que, mesmo se você não se envolver em qualquer comportamento de alto risco, continua mais propenso a desenvolver doenças cardíacas ou câncer. A razão para isto tem a ver com o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, o sistema de resposta ao estresse do corpo e cérebro e que rege nossa resposta de luta ou fuga. Como funciona? Bem, imagine que você está andando na floresta e você vê um urso. Imediatamente, o hipotálamo envia um sinal para a pituitária, que envia um sinal para a sua glândula adrenal que diz: "hormônios do estresse cortisol! Adrenalina! Avante! E seu coração começa a bater forte, suas pupilas dilatam, suas vias respiratórias se abrem, e você está pronto para lutar com o urso ou fugir dele. E isso é maravilhoso se você estiver em uma floresta na frente de um urso.
Mas o problema é quando o urso chega em casa todas as noites, e este sistema é ativado, uma e outra e outra vez, e ele deixa de ser adaptável, ou salva-vidas, e vira mal adaptado, ou prejudiciais à saúde. As crianças são especialmente sensíveis a essa ativação repetida do stress, porque seus cérebros e corpos estão apenas se desenvolvendo. Altas doses de adversidade não só afetam a estrutura e função do cérebro, que por sua vez, afeta o sistema imunológico em desenvolvimento, o que acaba complicando o desenvolvimento dos sistemas hormonais e até mesmo a maneira como o DNA é lido e transcrito.
Então, para mim, esta informação jogou meu treinamento pela janela, porque quando entendemos o mecanismo de uma doença, quando sabemos não só que vias são interrompidas, mas como, é nosso dever, como médicos, usar esta ciência para prevenção e tratamento. Isso é o que nós fazemos.
Assim, em San Francisco, criamos o Centro de Bem-Estar da Juventude para prevenir e curar os impactos das ACEs e estresse tóxico. Começamos simplesmente com rastreio de rotina de cada uma de nossas crianças em seus exames físicos regulares, porque agora sei que, se meu paciente tem uma pontuação ACE de 4, ele/ela tem duas vezes e meia mais chances de desenvolver hepatite ou DPOC, quatro vezes e meia de probabilidade aumentada de tornar-se deprimido, e 12 vezes mais probabilidade de tentar tirar sua própria vida, quando comparados com um paciente com zero ACEs. Para os nossos pacientes que testam positivo, temos uma equipe de tratamento multidisciplinar, que trabalha para reduzir a dose de adversidade e tratar os sintomas usando as melhores práticas, incluindo visitas e cuidados domiciliares, coordenação dos tratamentos dos vários membros da família, atenção à saúde mental, nutrição, intervenções holísticas, e sim, medicação quando necessário. Mas também é preciso educar os pais sobre os impactos das ACEs e estresse tóxico, da mesma forma que você faria para cobrir as tomadas elétricas, ou envenenamento por chumbo, e adequar o cuidado de nossos pacientes asmáticos e diabéticos de uma forma que entendam que eles podem precisar de um tratamento mais agressivo , tendo em conta as alterações de seus sitemas hormonal e imunológico.
Então, outra coisa que aconteceu quando compreendi esta ciência, é que queria gritar aos quatro ventos, porque este não era apenas um problema para as crianças em Bayview. Imaginei que, no minuto que todo mundo ouvisse falar nisso, se tornaria exame de rotina, com equipes de tratamento multi-disciplinares em todas as clinicas e haveria uma corrida para desenvolver o protocolos de tratamento clínico mais eficazes. Só que nada disso aconteceu, o que foi um enorme aprendizado para mim. O que eu tinha pensado simplesmente como melhor prática clínica agora entendo como um movimento. Nas palavras do Dr. Robert Block, ex-presidente da Academia Americana de Pediatria, "experiências adversas na infância são a maior ameaça à saúde pública para a qual não temos solução ou protocolo em nossa nação, hoje." E para muita gente, essa é uma perspectiva aterrorizante. O alcance ea escala do problema parecem tão grandes, que nos sentimos esmagados só de pensar como podemos abordá-lo.
Mas, para mim, isso é realmente onde a esperança mora, porque quando temos o enquadramento adequado, quando reconhecemos a coisa como uma crise de saúde pública, então podemos começar a utilizar o kit de ferramentas mais apropiado para chegar a soluções. Do tabaco à contaminação por chumbo, ao HIV / SIDA, os Estados Unidos realmente tem um forte histórico no endereçamento de problemas de saúde pública, mas replicar esses sucessos com ACEs e estresse tóxico vai necessitar de determinação e empenho, e quando olho para o que tem sido a resposta da nação até agora, me pergunto, por que não tomamos isso mais a sério?
No começo, pensei que marginalizavamos a questão porque não se aplicava a nós. Era um problema para as crianças de bairros pobres, negros e latinos. O que é estranho, porque os dados não suportam isso, pois o estudo ACEs original foi feito com uma população 70% branca e 70% com curso superior. Mas então, quanto mais falava com as pessoas, mais entendia que estava vendo o problema pelo avesso. Se perguntar quem, nesta sala, cresceu com um membro da família que sofria de doença mental, aposto que algumas mãos se levantariam. E se perguntarsse quantas pessoas tiveram um pai que talvez bebesse demais, ou que realmente acreditava que, se você poupar a vara, você estrague a criança, aposto que mais algumas mãos se levantariam. Mesmo nesta sala, esta é uma questão que toca muitos de nós, e eu estou começando a acreditar que nós marginalizamos a questão, porque se aplica a nós. Talvez seja mais fácil de ver as coisas em outros lugares, longe da gente. Não queremos encarar a coisa, preferimos ficar doentes.
Felizmente, os avanços científicos e, francamente, as realidades econômicas vão tornar essa opção cada dia menos viável. A ciência é clara: a adversidade precoce afeta drasticamente a saúde de toda uma vida. Hoje, estamos começando a entender como interromper a progressão da adversidade precoce, da doença e morte prematura, e em 30 anos a partir de agora, a criança que tem uma pontuação alta no ACE e cujos sintomas comportamentais passam despercebidos, cuja gestão da asma asma não está correlacionada com o resto dos problemas e que passa a desenvolver pressão alta e doenças cardíacas ou câncer precoce, vai ser tão anômala como uma mortalidade de seis meses a partir do diagnóstico de HIV / AIDS hoje. As pessoas vão olhar para essa situação e dizer: "O que diabos aconteceu lá?"
A única coisa mais importante que nós precisamos hoje é a coragem de olhar o problema na cara e dizer, isso é real e isso pode acontecer com todos nós. Eu acredito que nós somos o movimento.”
Nadine Burke Harris clique aqui
THE ADVERSE CHILDHOOD EXPERIENCES STUDY clique aqui
CALCULADOR ACE EM ESPANHOL E PDF PODE BAIXAR clique aqui
“Em meados dos anos 90, o CDC (Center for Desease Control- Centro para Contrôle de Doenças) e Kaiser Permanente descobriram uma exposição a um único fator, aumentava drasticamente o risco de desenvolver 7 em cada 10 das principais causas de morte nos Estados Unidos. Em altas doses, ele afeta o desenvolvimento do cérebro, o sistema imunológico, o sistema hormonal, e até mesmo a maneira como nosso DNA é lido e transcrito. Pessoas que estão expostas a doses muito elevadas, têm o triplo de risco de vida de doenças cardíacas e câncer de pulmão e uma diferença de 20 anos na expectativa de vida. E, no entanto, os médicos não são treinados para realizar exames ou tratamentos de rotina. Agora, a exposição que estou falando não é um pesticida ou um produto químico numa embalagem. É o trauma de infância.
Ok. Que tipo de trauma estou falando? Não estou falando de falhar em um teste ou perder um jogo de basquete. Estou falando de ameaças que são tão graves ou generalizada que literalmente penetram na nossa pele e mudam nossa fisiologia: coisas como abuso ou negligência, ou crescer com um dos pais que luta com uma doença mental ou dependência de substâncias.
Por longo tempo, vi essas coisas da maneira que fui treinada para vê-las:ou como um problema social ou como um problema de saúde mental , e só tinha que fazer os encaminhamentos necessários. E então algo aconteceu para me fazer repensar toda minha abordagem. Quando terminei minha residência, queria ir para algum lugar onde me sentisse realmente necessária, algum lugar onde pudesse fazer a diferença. Então, vim trabalhar para o Centro Médico do Pacífico, na Califórnia , um dos melhores hospitais privados no norte da Califórnia, e juntos, abrimos uma clínica em Bayview-Hunters Point, um dos mais pobres e carentes bairros em San Francisco. Antes disso, havia apenas um pediatra em toda Bayview para servir mais de 10.000 crianças, e aí fomos capazes de prestar cuidados de qualidade superior, independentemente da capacidade de pagamento. Foi tão legal. Mudamos as disparidades típicas da saúde: o acesso aos cuidados, as taxas de imunização, as taxas de internação por asma, e superamos todas as expectativas. Nos sentimos muito orgulhosos de nós mesmos.
Mas aí comecei a notar uma tendência preocupante. Um monte de crianças estavam sendo encaminhadas para mim com TDAH ou Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, mas quando eu fazia uma história e exame físico completos,o que encontrava era que maioria dos pacientes não encaixava neste diagnóstico. A maioria das crianças que estava vendo, tinha experimentado trauma tão grave que parecia que alguma coisa diferente estava acontecendo. De alguma forma, eu estava perdendo algo importante.
Agora, antes de fazer residência, fiz um mestrado em saúde pública, onde me ensinaram que, se você é médico e vê 100 crianças bebendo do mesmo poço, e 98 delas desenvolvem diarréia, você pode ir em frente e escrever prescrições de antibióticos sem parar, ou pode dizer: "que diabos há neste poço?" Então comecei a ler tudo o que podia sobre como a exposição à adversidade afeta os cérebros e corpos de crianças em desenvolvimento.
E então um dia, meu colega entrou no escritório, e disse, "Dr. Burke, você viu isso?" Em sua mão, uma cópia de um estudo de pesquisa chamado Experiências Adversas da Infância. Esse dia mudou minha prática clínica e, finalmente, minha carreira.
O Estudo de Experiências Adversas na Infância é algo que todo mundo precisa conhecer. Foi feito pelos doutores Vince Felitti (Kaiser) e Bob Anda (CDC), no qual exploraram 17.500 adultos a respeito de sua história de exposição ao que eles chamaram de "experiências adversas na infância"(ACEs). As questões incluiram abuso físico, emocional e/ou sexual; negligência física ou emocional; doença (s) mental, dependência de substâncias, encarceramento, separação ou divórcio dos pais e violência doméstica. Para cada sim, há um ponto na escala ACE. Daí correlacionaram essas pontuações com os resultados de saúde. O que descobriram foi surpreendente: 1- ACEs são incrivelmente comuns. 67% da população tinha pelo menos um ACE, e 12,6% (1 em cada 8), tiveram quatro ou mais ACEs. 2- Havia uma relação dose-resposta entre ACEs e resultados de saúde: maior a pontuação ACE, pior os resultados de saúde. Para uma pessoa com uma pontuação ACE de quatro ou mais, o risco relativo de doença pulmonar obstrutiva crônica foi duas vezes e meia a mais do que alguém com uma pontuação ACE de zero. No caso da hepatite, também foi duas vezes e meia. Para a depressão, era quatro vezes e meia. Para suicídio, era 12 vezes. Uma pessoa com uma pontuação ACE de sete ou mais tinha o triplo de risco de vida de câncer de pulmão e três vezes e meia o risco de doença isquêmica do coração, o assassino número um nos Estados Unidos da América.
O pessoal começou a olhar esses dados e dizer: “Bem, é claro que isso vai arruinar a sua saúde. Isso não é ciência. Este é apenas mau comportamento”. Ou, "Vamos lá. Você teve uma infância difícil, claro que está mais propenso a beber e fumar e fazer todas essas coisas."
Acontece que é exatamente onde a ciência entra. Agora, entendemos melhor do que jamais pudemos antes, como a exposição à adversidade precoce afeta os cérebros e corpos de crianças em desenvolvimento. Ela afeta áreas como o núcleo accumbens, o centro de prazer e recompensa do cérebro que está envolvido na dependência de substâncias. Ela inibe o córtex pré-frontal, o qual é necessário para o controle de impulsos e para funções executivas como julgamento, e é tmbém uma área crítica para o aprendizado. E em exames de ressonância magnética, vemos diferenças mensuráveis na amígdala, centro de resposta de medo do cérebro. Portanto, há razões neurológicos reais do porque as pessoas expostas a altas doses de adversidade são mais propensas a se envolver em comportamentos de alto risco, e isso é importante saber.
Mas acontece que, mesmo se você não se envolver em qualquer comportamento de alto risco, continua mais propenso a desenvolver doenças cardíacas ou câncer. A razão para isto tem a ver com o eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, o sistema de resposta ao estresse do corpo e cérebro e que rege nossa resposta de luta ou fuga. Como funciona? Bem, imagine que você está andando na floresta e você vê um urso. Imediatamente, o hipotálamo envia um sinal para a pituitária, que envia um sinal para a sua glândula adrenal que diz: "hormônios do estresse cortisol! Adrenalina! Avante! E seu coração começa a bater forte, suas pupilas dilatam, suas vias respiratórias se abrem, e você está pronto para lutar com o urso ou fugir dele. E isso é maravilhoso se você estiver em uma floresta na frente de um urso.
Mas o problema é quando o urso chega em casa todas as noites, e este sistema é ativado, uma e outra e outra vez, e ele deixa de ser adaptável, ou salva-vidas, e vira mal adaptado, ou prejudiciais à saúde. As crianças são especialmente sensíveis a essa ativação repetida do stress, porque seus cérebros e corpos estão apenas se desenvolvendo. Altas doses de adversidade não só afetam a estrutura e função do cérebro, que por sua vez, afeta o sistema imunológico em desenvolvimento, o que acaba complicando o desenvolvimento dos sistemas hormonais e até mesmo a maneira como o DNA é lido e transcrito.
Então, para mim, esta informação jogou meu treinamento pela janela, porque quando entendemos o mecanismo de uma doença, quando sabemos não só que vias são interrompidas, mas como, é nosso dever, como médicos, usar esta ciência para prevenção e tratamento. Isso é o que nós fazemos.
Assim, em San Francisco, criamos o Centro de Bem-Estar da Juventude para prevenir e curar os impactos das ACEs e estresse tóxico. Começamos simplesmente com rastreio de rotina de cada uma de nossas crianças em seus exames físicos regulares, porque agora sei que, se meu paciente tem uma pontuação ACE de 4, ele/ela tem duas vezes e meia mais chances de desenvolver hepatite ou DPOC, quatro vezes e meia de probabilidade aumentada de tornar-se deprimido, e 12 vezes mais probabilidade de tentar tirar sua própria vida, quando comparados com um paciente com zero ACEs. Para os nossos pacientes que testam positivo, temos uma equipe de tratamento multidisciplinar, que trabalha para reduzir a dose de adversidade e tratar os sintomas usando as melhores práticas, incluindo visitas e cuidados domiciliares, coordenação dos tratamentos dos vários membros da família, atenção à saúde mental, nutrição, intervenções holísticas, e sim, medicação quando necessário. Mas também é preciso educar os pais sobre os impactos das ACEs e estresse tóxico, da mesma forma que você faria para cobrir as tomadas elétricas, ou envenenamento por chumbo, e adequar o cuidado de nossos pacientes asmáticos e diabéticos de uma forma que entendam que eles podem precisar de um tratamento mais agressivo , tendo em conta as alterações de seus sitemas hormonal e imunológico.
Então, outra coisa que aconteceu quando compreendi esta ciência, é que queria gritar aos quatro ventos, porque este não era apenas um problema para as crianças em Bayview. Imaginei que, no minuto que todo mundo ouvisse falar nisso, se tornaria exame de rotina, com equipes de tratamento multi-disciplinares em todas as clinicas e haveria uma corrida para desenvolver o protocolos de tratamento clínico mais eficazes. Só que nada disso aconteceu, o que foi um enorme aprendizado para mim. O que eu tinha pensado simplesmente como melhor prática clínica agora entendo como um movimento. Nas palavras do Dr. Robert Block, ex-presidente da Academia Americana de Pediatria, "experiências adversas na infância são a maior ameaça à saúde pública para a qual não temos solução ou protocolo em nossa nação, hoje." E para muita gente, essa é uma perspectiva aterrorizante. O alcance ea escala do problema parecem tão grandes, que nos sentimos esmagados só de pensar como podemos abordá-lo.
Mas, para mim, isso é realmente onde a esperança mora, porque quando temos o enquadramento adequado, quando reconhecemos a coisa como uma crise de saúde pública, então podemos começar a utilizar o kit de ferramentas mais apropiado para chegar a soluções. Do tabaco à contaminação por chumbo, ao HIV / SIDA, os Estados Unidos realmente tem um forte histórico no endereçamento de problemas de saúde pública, mas replicar esses sucessos com ACEs e estresse tóxico vai necessitar de determinação e empenho, e quando olho para o que tem sido a resposta da nação até agora, me pergunto, por que não tomamos isso mais a sério?
No começo, pensei que marginalizavamos a questão porque não se aplicava a nós. Era um problema para as crianças de bairros pobres, negros e latinos. O que é estranho, porque os dados não suportam isso, pois o estudo ACEs original foi feito com uma população 70% branca e 70% com curso superior. Mas então, quanto mais falava com as pessoas, mais entendia que estava vendo o problema pelo avesso. Se perguntar quem, nesta sala, cresceu com um membro da família que sofria de doença mental, aposto que algumas mãos se levantariam. E se perguntarsse quantas pessoas tiveram um pai que talvez bebesse demais, ou que realmente acreditava que, se você poupar a vara, você estrague a criança, aposto que mais algumas mãos se levantariam. Mesmo nesta sala, esta é uma questão que toca muitos de nós, e eu estou começando a acreditar que nós marginalizamos a questão, porque se aplica a nós. Talvez seja mais fácil de ver as coisas em outros lugares, longe da gente. Não queremos encarar a coisa, preferimos ficar doentes.
Felizmente, os avanços científicos e, francamente, as realidades econômicas vão tornar essa opção cada dia menos viável. A ciência é clara: a adversidade precoce afeta drasticamente a saúde de toda uma vida. Hoje, estamos começando a entender como interromper a progressão da adversidade precoce, da doença e morte prematura, e em 30 anos a partir de agora, a criança que tem uma pontuação alta no ACE e cujos sintomas comportamentais passam despercebidos, cuja gestão da asma asma não está correlacionada com o resto dos problemas e que passa a desenvolver pressão alta e doenças cardíacas ou câncer precoce, vai ser tão anômala como uma mortalidade de seis meses a partir do diagnóstico de HIV / AIDS hoje. As pessoas vão olhar para essa situação e dizer: "O que diabos aconteceu lá?"
A única coisa mais importante que nós precisamos hoje é a coragem de olhar o problema na cara e dizer, isso é real e isso pode acontecer com todos nós. Eu acredito que nós somos o movimento.”
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